sexta-feira, 4 de abril de 2008

78 - As matérias, os processos e as vontades

artigo gentilmente cedido pela autora - amiga - para publicação neste blog

Apenas poucas semanas após a conclusão da obra, não é o primeiro e não será o último artigo sobre a Casa de Arruda, projectada pelos arquitectos do Plano B.

A arquitectura não é uma arte porque tem uma finalidade útil - disse há poucos dias em plena cinemateca o realizador Manuel de Oliveira. Uma quase centena de anos para quase duas centenas de estudantes de arquitectura. Se não é uma arte, é um ofício. E com mais ênfase se o pode dizer depois de conhecer o processo que ergueu a Casa de Arruda.

Os arquitectos do Plano B levam como estandarte a sua, e nossa, condição pós-industrial. A ecologia de verde passou a madura e caiu por terra. Ficou a árvore despida à procura da essência da arquitectura e fez-se da Casa de Arruda um protótipo da Arquitectura como ofício. Arquitectura que cumpre uma finalidade útil com os recursos justos e necessários e que, como nos filmes do realizador, encontra o que já lá está.

Arquitectura que experimenta tudo o que o Meio nos dá: as matérias, os processos, as vontades. Uma conversa de alguém que se senta à mesa com um desconhecido e discute o que pode ser uma casa, usando a discussão para o descobrir.

Não é outra a função da arquitectura: descobrir as matérias, os processos e as vontades que existem e delas fazer edifícios. Fê-lo a arquitectura pré-industrial, a industrial e a pós-industrial. Não é necessária a bandeira da ecologia para o fazer. Nem a bandeira pós-industrial. Não haveria Casa de Arruda sem sol poente a escorregar pela sala nem haveria Casa de Arruda sem se trazer pelas vinhas aquele grande vidro que delas nos separa.

Podia-se falar de contexto, de impacte ambiental, de térmica, de neutralidade espacial, de proporção geométrica, de modulação. Mas pensa-se em ecologia e pós-industrialização. A pressão dos paradigmas num ansiado momento de transição. E afinal não é de paradigmas que se trata mas de arquitectura de artesãos.

Os arquitectos e o cliente, na sua postura de partilha entre si e com a comunidade, não foram senão artesãos de um bem necessário que, como um sapato muito bem feito, exibe o que foi empregue para que se tenha tornado um bom sapato, quente e confortável, resistente e flexível, ajustado e elegante, e útil para caminhar. Expõe as matérias, os processos e as vontades disponíveis e necessárias.

Artesãos de um bem maior – o arquétipo da casa útil para se habitar – os arquitectos e o cliente fizeram da conversa à roda da mesa algo sólido e que não se dissolve no ar: um exemplo de como intervir no território e na comunidade com tudo o que cá está e para que não se acabe, mas sem que se reduza à monótona perpetuação.

J. Mourão

2 comentários:

Anónimo disse...

Construindo com poesia e respeito.

Obrigado pela partilha.

Esmeralda

100 Planos disse...

Parabéns pelo sonho, pelo projecto e pelo processo.
Foi com grande entusiasmos e interesse que acompanhamos à distancia o nascimento desta casa. Agora que está concluida resta-nos apenas desejar aos intervenientes um sono descansado e a maior das felicidades.

100 Planos Arquitectura